In Relatório à Assembleia da República
10. A Câmara Municipal de Gavião, em parecer da Divisão de Obras e Serviços Urbanos, de 2 de Maio de 1995, reafirma o entendimento "de estarem em causa interesses particulares", não tendo aplicação, portanto, o Regulamento Geral das Edificações Urbanas. Esta informação foi homologada na mesma data pelo Senhor Presidente, que deliberou "oficiar à Exm.ª Autoridade Sanitária".
O que acontece quando a recomendação acatada, não passa do papel, será inverdade ou despudor??
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Ao
Exm.º Senhor
Presidente da Câmara Municipal de Gavião
R-1293/95
Rec. n.º 4/A/96
1996.01.12
I
Exposição de Motivos
1. O presente processo parte de uma reclamação sobre um conflito negativo de competências, no âmbito do qual, tanto a Câmara Municipal de Gavião, como a Autoridade Sanitária daquele Concelho, declinam competências para a satisfação de uma necessidade pública local.
2. Esta diz respeito à existência de um esgoto a céu aberto, resultante do lançamento, num vale de rega desactivado, de águas residuais domésticas sem qualquer tratamento.
3. As águas residuais domésticas são provenientes de uma habitação contígua à do reclamante, Senhor A., e resultam da circunstância - segundo informação técnica da Câmara Municipal de Gavião datada de 2 de Março de 1994 - de faltar "área suficiente no logradouro para permitir a construção de uma fossa séptica e poço absorvente".
4. Uma vez que as águas não tratadas, "provenientes de máquina de lavar, lavatório, bidé e banheira" (cfr. a informação supra citada), são lançadas para a vala de rega já desactivada que atravessa o quintal da casa do queixoso, este reclama da situação de insalubridade e alega perigo para a saúde pública.
5. De referir que o ora reclamante trancou a vala de rega, impedindo, deste modo, a passagem das águas, situação que, por sua vez, motivou, em Fevereiro de 1994, um "pedido de intervenção da Câmara Municipal", assinado pela proprietária da habitação contígua, Sra. B.
6. Pelo que se verifica que foram instruídos na Câmara Municipal de Gavião, versando o mesmo conjunto de factos, dois processos: num a reclamante é a Sra. B. e a situação denunciada é o bloqueio da vala de rega pelo Sr. A.; no outro, a queixa incide sobre o despejo das águas residuais na vala de rega, sendo que o reclamante é o anterior reclamado, surgindo a Sra.B. na posição de queixosa.
7. Em ofício assinado pelo Senhor Presidente da Câmara Municipal de Gavião, de 28 de Março de 1994 e dirigido ao ora reclamante na Provedoria de Justiça, foi este informado "que a queixa foi mandada arquivar, por meu despacho de 18/3/94, porque a resolução da questão, por envolver interesses exclusivamente particulares, não é da competência desta Câmara Municipal".
8. Por ofício, de 31 de Maio do mesmo ano, proveniente, ainda, da Câmara Municipal de Gavião, assinado pelo Senhor Presidente e dirigido, igualmente, ao reclamante, foi este informado que "por se tratar de uma
questão de saúde pública deve o assunto ser remetido ao Exm.º Senhor Delegado de Saúde".
9. Tendo sido solicitada a intervenção da autoridade sanitária do Concelho de Gavião, foi por esta remetido ofício, em 20 de Abril de 1994, ao Senhor Presidente da Câmara Municipal de Gavião, na qual se solicitava que fossem "verificados os factos e tomadas as medidas que tal situação impõe (R.G.E.U. art.º 12.º e 13.º)".
11. Resulta do teor da já referida informação de 2 de Março de 1994, que tanto a Sra. B., como o Sr. A., têm motivos de insatisfação pela situação que actualmente ocorre.
12. Na realidade, e citando, dizia-se no mencionado documento que a Sra. B. "tem razão em protestar pelo facto de o Sr. A. ter trancado a vala de rega, mas por outro lado a Sra.B. não pode utilizar a referida vala como esgoto".
13. Não obstante, a posição da Câmara Municipal de Gavião, de que "o assunto, por envolver interesses exclusivamente privados, não é da competência desta Câmara Municipal" não se nos afigura defensável. Na realidade, tais interesses, embora privados, têm implicações de saúde pública, pela falta de condições de salubridade de uma das edificações envolvidas.
14. É da competência das Câmaras Municipais a fiscalização do cumprimento das disposições do Regulamento Geral das Edificações Urbanas (adiante referido apenas por R.G.E.U.), designadamente das do Capítulo IV, referentes às instalações sanitárias e esgotos, como resulta do art.º 2.º do diploma aprovado pelo Decreto-Lei n.º 38.382, de 7 de Agosto de 1951.
15. Por outro lado e em termos gerais, é, igualmente da competência municipal a fiscalização das condições de salubridade dos edifícios, nos termos do art.º 10.º do mesmo diploma.
16. Mais: às câmaras municipais é facultada a possibilidade de determinarem a realização de obras e reparações em edificações particulares, por razões de saúde pública ou de salubridade, como determina o art.º 12.º do R.G.E.U.
17. Tendo os serviços da Câmara Municipal de Gavião encontrado uma solução técnica para a questão objecto de reclamação, a sua realização coerciva poderia ter sido determinada, nos termos legais, mesmo contra a vontade do Sr. A. e da Sra. B.
18. Do disposto no Decreto-Lei n.º 336/93, de 29 de Setembro - designadamente do teor dos art.ºs 5.º, 7.º e 8.º, os quais definem, a diferentes níveis, a competência das autoridades de saúde - resulta que é incumbência destas, entre outras, "fazer cumprir as normas que tenham por objecto a defesa da saúde pública" (cfr. alínea b) do n.º 1 do art.º 8.º).
19. Não obstante, a situação de insalubridade que determinou a instauração de dois processos na Câmara Municipal de Gavião e que ora nos ocupa, resulta do incumprimento das normas do R.G.E.U., diploma que, igualmente, prevê os dispositivos fiscalizadores e sancionatórios e nomeia as entidades a quem incumbe aplicá-los.
20. Pelo que, em obediência a um princípio de especialidade, verifica-se dever ser a Câmara Municipal de Gavião a buscar as soluções técnicas necessárias à correcção da situação de insalubridade verificada e a impô-las, ainda que coercivamente, aos particulares envolvidos.
21. Até porque, as mais das vezes, e após verificar a existência de uma situação potencialmente gravosa para a saúde pública, nada mais resta às autoridades de saúde do que buscar o auxílio funcional de uma outra entidade, em cumprimento, aliás, do Decreto-Lei n.º 336/93, que prevê "o concurso das autoridades administrativas e policiais, para o bom desempenho das suas funções" (cfr. art.º 8.º, n.º 1, alínea c)).
22. É incumbência da Câmara Municipal de Gavião, e não da autoridade sanitária concelhia, a prossecução do interesse público em presença, pois "a norma especial em que se baseia a decisão administrativa obriga à averiguação de saber se, a par do interesse público, também deve ser protegido o interesse concreto do decisão (...). A norma de protecção da vizinhança caracteriza-se, assim, pela sua dupla protecção: dos interesses públicos e dos interesses privados." (SOUSA, ANTÓNIO FRANCISCO - "Para o Consentimento do Particular em Direito Administrativo ", Lisboa, 1986, pág. 63).
II
Conclusões
Pelo que fica exposto e no exercício do poder que me é conferido pelo disposto no art.º 20.º, n.º 1, alínea a) da Lei n.º 9/91, de 9 de Abril,
R e c o m e n d o
1.º Que a Câmara Municipal de Gavião, após verificar, através de vistoria, quais as obras necessárias para corrigir as más condições de salubridade existentes na habitação da Sra. B., determine a sua realização coerciva.
2.º Que, caso as obras não sejam executadas no prazo estipulado, sejam levadas a efeito pela Câmara Municipal de Gavião, no uso da faculdade conferida pelo art.º 166.º do Decreto-Lei n.º 38.382, de 7 de Agosto de 1951, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-lei n.º 44.258, de 31 de Março de 1962, a expensas dos infractores.
Recomendação acatada “
O que acontece quando a recomendação acatada, não passa do papel, será inverdade ou despudor??
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